É preciso acreditar no que dizemos sobre nós. Trabalhar nossa face positiva e tentar influenciar no ethos do discurso. Ser menos irônico nas situações que não conseguimos resolver e que fingimos tirar de letra, ajuda bastante. É difícil, mas não é impossível. Ou é melhor sermos nós mesmos, com todos nossos defeitos e bondades calientes, mas se assim o formos evitaremos o dissabor da mentira descoberta sobre quem não somos.
A cada dia vejo que algumas coisas que me pareciam "ordenadas" em minha vida, mudam de lugar e fazem gerar novamente uma nova ordem, ou, quem sabe, uma nova desordem experimental, uma vez que já compreendi que tudo é mutável, até mesmo aquelas coisas que parecem estar fincadas, enraizadas, no solo que (não) nos pertence.
Desde nova tenho um apreço inexplicável pelos livros e estudos, bem como um mapa fisiológico (gosto dessa expressão) sobre quem gostaria de ser quando crescesse. A última instância seria a de ser professora. Para acalentar os sonhos paternos seria médica para cuidar dos meus pais quando eles já estivessem velhinhos. Sonhava (acho que ainda sonho) com uma casa só minha, decorada do meu jeito e que poderia até não ter uma cozinha, mas deveria obrigatoriamente ter um canto para "o saber".
Os livros médicos que eu deveria ter, deram lugar ao legado de clássicos da Linguística e de literaturas sobre a história da igreja, comunismo e autobiografias diversas. Todos lidos e tocados, refletidos e compreendidos, lições de vida. Sou outro tipo de médica. Sou médica do saber e busco melhorar a educação do meu país prescrevendo emendas, que dignifiquem um pouco o cidadão carente de informação e cultura: sou professora. Minha casa não é minha e "meu lar é minha cabeça".
Às vezes sou controvérsia, deixo o estudo no canto de castigo, implorando minha sempre generosa atenção e caio na gandaia. Vou à farra e deixo as deliberações urgentes acontecerem conforme forem se ajustando sem mim. Provoco a desordem que não me pertence. Até o vazio me invadir e as perguntas do meu Eu gritarem "ei, você não é só isso". E num lampejo de consciência, volto ao meu mundo (des)ordenado de sempre.
Constatemente, tenho me perguntado se estou ficando velha em razão das escolhas e da vida que venho tendo. E a resposta é sempre única: não, eu amadureci e estou pagando pelas escolhas que fiz lá atrás em 2000, quando decidi prestar vestibular para Letras e mais recentemente em 2010, quando decidi investir mais ainda em minha profissão e cursar mestrado, pois quero ser professora universitária.
Eu não consigo ser só uma coisa. Eu não consigo ser "só isso". Quando vou lá adiante e vivo uma vida desregrada, meu fio limítrofe estanca e eu volto ser a Aline de sempre: apaixonada pelos livros, estudiosa, profissional e com uma leve queda por umas farrinhas pra descontrair. Quando uma prioridade tenta tomar o lugar da outra, entro em crise e fico um ser absurdamente insuportável, chata e intolerante.
E nessas horas que penso que não adiante se dizer sobre o que não se é, porque as pessoas sabem de você, por vezes muito mais do que você mesma e acabamos por passar por meras reprodutoras das idiotices subhumanas. E é quem você é que ordenará quem fica em sua vida mais próximo ou mais distante, porque ao contrário do senso comum, são os semelhantes que se atraem.
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Corajosamente vivendo...diga-me