Invadi sozinha um bar. Pedi um trago de bebida forte, uma porção de torta de maçã. Fiquei distraída olhando ao redor rezando para nossa senhora do invisível que nem um conhecido me espreitasse. Depois remoí a semana intensa que tive e adorei estar naquele lugar repleto de desconhecidos, homens e mulheres indecifráveis, mas todos acompanhados sussurando em uníssono "quem essa daí está esperando?"
Ui, ninguém! Complexamente, ninguém. Assiti, fingindo indiferença, a uma partida de bilhar entre dois casais. Escutava umas músicas cafonas e me divertia com aquelas rimas deploráveis parecendo surgir das profundezas do inferno. Resolvi soltar o cabelo e mandar descer dois chopps, "pronto ele deve estar chegando", devem ter pensado.
Garçom, mais um, por favor! Tomei 5 páginas de letras indiscretas e me afoguei no riso quando um porre me disse "sai fora, ele não deve ter conseguido escapar da mulher". Nossa, eu tinha cara de outra. Será que isso é melhor do que não ter cara nenhuma?
Ensaiei uma resposta, mas preferi um sorriso pálido: havia gostado do personagem que haviam me dado. Para inflamar mais, tirei o celular do bolso e ensaiei indelicadas e insistentes chamadas para meu suposto amante. A galera pirou! Fiz cara de raiva, mandei descer mais dois chopps, virei o primeiro, degustei o segundo, retoquei o batom vermelho.
"Um bilhete para senhorita". Guardei na bolsa sem lê-lo. Mandaram-me um tira gosto, porém desejei eferver lenta e bruscamente como sorrisal do bêbado ao lado. A cabeça girava e as palavras já saíam pesada, o dedo mal levantava pedindo mais um.
Resolvi guardar o livro, pois as letras há muito já dançavam à minha frente. "Moça, posso sentar aqui", pediu-me um grotesco cavaLEIRO, "sim, sim" respondi e imediatamente me levantei para deixá-lo mais à vontade.
Novamente, puxei o telefone e fingir ligar para ele. Comecei a acreditar naquela mentira (seria assim as pessoas que quando resolvem ser um personagem, uma hora passam acreditar na sua própria mentira?). Desliguei o telefone revoltada, mais uma vez fingia. Ganhei um chopp, sentada ao balcão erá mais fácil o assédio. Decidi não tomar, um boa noite cinderela não estava nos meus planos, nem aquele estranho bar estava, confesso.
Paguei a conta com cheque sem fundo. Saí e choquei ao descobrir que meu carro não estava mais em frente ao bar. Desesperei-me! Puxei o telefone para pedir ajuda, eis que constatei ser impossível, já que não havia um contato listado no celular novo. Precisava chegar em casa o mais breve possível para saber do carro.
Não havia carro, não havia há quem ligar, não havia livro na bolsa, não havia sobriedade, não havia sorrisal, só o que havia era meu amante fulo da vida me esperando com um buquê murcho e um café amargo. No mais, existia um amante.
Não era mentira o encontro, eu é que não havia ensaiado aquela parte!
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Corajosamente vivendo...diga-me