Ensaiei anos a melhor forma de me dizer pra ele. Quando era adolescente, escrevi centenas de cartas, toscas, impublicáveis, rasas, tal qual um amor de menina. As queimei quando me encantei no negro de outros olhos, levada até lá pela partida suave dele para outro ponto de vista. Reensaiei o dizer guardado a sete chaves, quando lhe vi plainando em minha vida, me enganando com um sim que insistia em estar longe de mim.
E o guardei novamente. Escrevi novas cartas, publiquei outros contos, reescrevi minhas poesias, armazenei seu olhar, lacei seu dizer, me musiquei em outros carnavais. E ele veio para mim, marcando seu ponto de intensidade por uns dias. Era tão platônico, que me desnorteava. "E foi tão corpo, que foi puro espírito". E ele se foi novamente, perder-se noutros espinhos, ferir-se com outras monotonias, experimentar outras solidões. Ele nada sabe sobre o amor, sabe sobre o sofrer, disso ele é vida.
Não queimei meus dizeres. Guardei-os, prometendo sua publicação para além de mim. Ganhei um beijo intenso, um passeio de mãos dadas, um encontro para depois, promessas mal dizidas, uma raiva desconcertante. Pronto: promessa cumprida! Disse-lhe das minhas ânsias de adolescente, dos esconderijos nas esquinas, da frustração pela negação e pela dor de lhe ver sofrer. Platônico? Não. Amor intocável, maduro, paciente, "ferida que dói e não se sente". Vivi a paciência intensa de lhe ver indo tão longe, para longe, para lá.
Eu nunca lhe tive e ele nunca me teve. Nunca partilhamos sonhos, beijos, cores, músicas, perspectivas. Mas hoje eu preciso ir, não porque não suporto sua ausência, já que ela sempre tive, mas exatamente porque não suporto mais sua ignorância subhumana de se deplorar e se perder diante da vida que ele nunca se permitiu ter.
Eu tenho um amor que pulsa, eu tenho a paz que me leva a sorrir... se ele soubesse o quanto isso é bom, permitia-se uma nova chance se construindo feliz. Porque sua dor dói em mim e eu já estou tempo demais longe de casa, e agora "estou voltando pra casa de vez..."
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Corajosamente vivendo...diga-me